As ações coletivas são ferramentas potentes para garantir a representatividade e a defesa dos direitos da classe trabalhadora. Processos desse tipo tornam-se o melhor caminho para situações em que é possível pleitear um benefício ou uma reparação comum a uma coletividade. No âmbito da justiça trabalhista, por exemplo, isso pode incluir empregados ocupantes de cargos similares em um mesmo banco – ou mesmo de uma categoria profissional inteira. Embora seja um termo bastante debatido, muitos profissionais têm dúvidas se vale a pena entrar em uma ação coletiva. Esses processos são realmente vantajosos? Qual o risco do trabalhador?
A seguir, a seção #DQT (Direito de Quem Trabalha) vai trazer mais detalhes sobre essa questão. O texto abaixo recebeu o suporte do advogado Ricardo Nunes de Mendonça, sócio do escritório Gonçalves, Auache, Salvador, Allan & Mendonça (GASAM), de Curitiba (PR), integrante do Ecossistema Defesa da Classe Trabalhadora (Declatra). Confira!
Ação coletiva: quem move o processo?
Primeiramente, é importante entender quem são os responsáveis por mover uma ação coletiva. Em geral, esse tipo de processo é liderado pelos chamados “entes extraordinários”. Os mais comuns são os sindicatos de classe e o Ministério Público do Trabalho (MPT). Eles propõem ações coletivas quando são identificados fatos ou danos comuns a uma coletividade de trabalhadores. O conceito da ação coletiva trabalhista é garantir que todos os profissionais desse grupo tenham acesso ao direito pleiteado.
Diferenças entre MPT e Sindicatos
Os sindicatos e o MPT têm abordagens distintas em relação às ações coletivas. Abaixo, abordamos algumas delas.
MPT: o guardião da legislação trabalhista
“O MPT é o que a gente chama de ‘guardião da legislação trabalhista’”, define Ricardo Mendonça, do Gasam Advocacia. Ele explica que o MPT entra em cena sempre que verificar um dano coletivo. Ou seja, uma ilegalidade que transcende o interesse de um indivíduo e alcança uma categoria ou mais de uma categoria. A entidade, assim, atua em nome próprio para combater essa ilegalidade.
Nesse sentido, o MPT pode utilizar mecanismos administrativos ou técnicas jurídicas de tutelas. O primeiro refere-se a denúncias e provas que confirmam um prejuízo sofrido pelos trabalhadores. A situação pode ser solucionada por meio de um acordo extrajudicial – o chamado Termo de Ajustamento de Conduta, assinado pelo empregador. Ele se compromete a sanar e equilibrar o eventual prejuízo.
O segundo conceito, entretanto, é mais amplo. Aqui, as ações coletivas entram em cena. Elas são utilizadas, por exemplo, quando o empregador recusa a assinatura do Termo de Ajustamento de Conduta. Nesse caso, o MPT pode pedir ao Judiciário que determinado empregador ou grupo de empregadores deixe de adotar uma conduta, abstenha-se de fazer alguma coisa ou mesmo adote uma determinada conduta prevista em lei. Além disso, a entidade pode pedir indenizações aos trabalhadores — seja em dinheiro ou em práticas que reparem o dano.
Sindicato: defensor dos direitos das categorias profissionais
Os sindicatos são os entes que defendem os direitos e os interesses coletivos ou individuais de uma categoria profissional ou econômica. Eles atuam com base no Princípio da Unicidade Sindical, na mesma base territorial. Mas o que isso quer dizer? A gente explica.
Isso quer dizer que o sindicato defende uma categoria profissional de uma região geográfica específica. Existe um sindicato dos bancários em Curitiba (PR) e outro em Londrina (PR), por exemplo. São da mesma categoria, mas estão em regiões diferentes do Paraná. É possível, entretanto, que vários sindicatos se reúnam para ingressar com a mesma ação coletiva contra um empregador. Movimentos desse tipo ocorrem quando é identificado um dano comum aos trabalhadores daquele estado – ou mesmo do país. O direito chama essa atuação de litisconsórcio ativo – quando há pluralidade de autores na mesma ação. É o que ocorre, por exemplo, com a questão da 7ª e da 8ª hora dos bancários.
Ação coletiva: o exemplo das 7ª e 8ª horas dos bancários
Um exemplo prático são ações coletivas que visam garantir o pagamento pelas 7ª e 8ª horas trabalhadas pelos bancários. A existência desse fato comum garante aos empregados dos bancos o mesmo direito – é o chamado direito individual homogêneo. Quando um sindicato ingressa com uma ação coletiva de 7ª e 8ª horas, todos os bancários que tenham trabalhado nessa condição específica nos últimos cinco anos (incluindo ex-empregados) serão contemplados. Ou seja, é um ganho mais amplo.
Entrar em uma ação coletiva: as cinco principais vantagens
Quais são, afinal, as vantagens do trabalhador ao entrar em uma ação coletiva? A gente aborda os cinco principais benefícios a seguir.
Amplitude
A primeira vantagem das ações coletivas é a amplitude alcançada. Nas ações coletivas, tanto empregados como ex-empregados que tenham feito parte da categoria e que tenham direitos de origem comum são albergados por elas. “Isso é muito importante para a sociedade. Você reestabelece uma ilegalidade, de uma só vez, para todo mundo. Ainda há o fator econômico, pois o judiciário e a própria sociedade gastam menos energia e menos dinheiro”, avalia Mendonça.
Não há sucumbência
A segunda vantagem de entrar com ação coletiva é que não existe o risco de sucumbência para o substituído. Esse termo refere-se à responsabilidade de o proponente arcar com custas, honorários e demais despesas processuais caso perca ação. Ou seja, mesmo que a justiça não acate o pedido do processo coletivo, o trabalhador não terá gastos. É, portanto, um caminho mais seguro do que a ação individual.
Coisa Julgada
Uma ação coletiva jamais representará a retirada de algum direito ao trabalhador. No direito, diz-se que a “coisa julgada” nas ações coletivas dedicadas à tutela de direitos individuais homogêneos só vai acontecer para beneficiar os os substituídos. Nunca para prejudicá-los.
Digamos que uma ação coletiva peça uma equiparação salarial por desigualdade de gênero para determinada categoria. Caso a justiça negue essa equiparação, as trabalhadoras discriminadas poderão ajuizar ações individuais para reclamar seus direitos, baseando suas pretensões nos seus respectivos casos concretos. Ou seja, a trabalhadora ou o trabalhador não tem como sair perdendo. Além disso, mesmo que a ação coletiva seja negada, o empregado continua com o direito de pleitear o mesmo benefício e discutir o seu caso específico por meio de uma ação individual.
Ação coletiva e interrupção da prescrição
Prescrição é o prazo que a justiça determina para avaliar eventuais prejuízos cometidos contra o trabalhador. Uma ação trabalhista abrange os últimos cinco anos trabalhados. Benefícios violados antes disso já prescreveram e não são considerados no processo. A não ser que exista uma ação anterior, com o mesmo objeto, que tenha interrompido a prescrição. A ação coletiva se presta a esse fim.
Digamos que o sindicato da sua categoria ingressou com uma ação coletiva em julho de 2014. Após cinco anos, o processo foi negado pela justiça. Você foi demitido em 2021 e entrou com uma ação trabalhista individual pedindo a mesma revisão de benefícios que haviam sido incluídos naquela ação coletiva. Numa situação normal, a justiça só avaliaria os últimos cinco anos. Ou seja, até 2016.
Entretanto, como houve uma ação coletiva nesse sentido, a prescrição foi interrompida no momento do ajuizamento da ação. Isto é, julho de 2014. Assim, você poderá pleitear benefícios violados nos cinco anos anteriores a 2014, aumentando o período que o cálculo irá cobrir.
Ação coletiva x Ação Individual
A ação coletiva não retira do trabalhador o direito de ingressar com uma ação individual sobre o mesmo tema. Contudo, pode haver implicações se já existir uma ação coletiva à qual o trabalhador não aderiu.
Nesse caso, ele abre mão dos efeitos da ação coletiva. Como assim? Se a ação coletiva for vitoriosa, o empregado não se beneficia dela. Ou seja, ficará tudo concentrado na sua ação individual. Se esse processo particular não tiver sucesso, o trabalhador não terá mais caminhos para pleitear seus direitos.
Assim, o advogado Ricardo Mendonça ressalta que, como regra, é sempre mais benéfico esperar o desenvolvimento da ação coletiva. E só depois, portanto, ingressar com uma ação individual.
Entrar em uma ação coletiva: como fazer?
Os sindicatos são o melhor caminho para entrar em uma ação coletiva. Uma boa forma de acesso é ficar de olho nos canais de comunicação dessas entidades. Em geral, os sindicatos informam os trâmites e advogados responsáveis pelas ações coletivas por meio de sites, newsletter e rede sociais. Além disso, o trabalhador pode ter acesso a essas ações consultando os canais da própria Justiça do Trabalho.
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#DQT (Direito de Quem Trabalha) é um serviço de conteúdo informativo elaborado pelos escritórios Gonçalves, Auache, Salvador, Allan & Mendonça (Gasam), de Curitiba (PR), e Marcial, Pereira e Carvalho (MP&C), de Belo Horizonte (MG). Ambos integram o Ecossistema Defesa da Classe Trabalhadora (Declatra).